Por Laura Lucy Dias
Essa é uma resenha crítica e
poderá conter spoilers. Não contarei nada sobre o livro, mas as comparações e
os itens contados são reveladores, e se darão sobre os itens textuais, de
adaptação e sobre as histórias contadas.
Para começar, eu vi o filme
primeiro, na semana do lançamento. O livro vim a ler agora, terminei ele
anteontem (3/8/2014). O filme é lindo, uma boa adaptação, mas como acontece com
outro filme/livro que amo – o “A casa dos espíritos”, com as lindíssimas Meryl
Streep, Glenn Close – não há como abranger todo o conteúdo, e assim o
roteirista tem que se virar para manter a essência do livro no filme, sem
prejudicar, mesmo que a adaptação seja drástica como em muitos casos.
Primeiramente o livro tem quase
400 páginas, e passasse por vários anos. O filme tem apenas a duração básica de
pouco mais de uma hora, quase duas. Não há como fazer milagre, por isso a gente
começa a perdoar. Mas o que não perdoo foi a alteração da voz do narrador. Na
quarta capa já se sabe que o livro é narrado pela morte, não é? Então... no
livro ela se dirige a si mesma como um ser feminino. No filme colocaram a voz
masculina, e isso, ao comparar com o livro e o desenvolvimento do narrador
personagem (é, ela é personagem, sim) do livro, não haveria como ser um ser de
princípio masculino. Isso me ultrajou como mulher e especialista em literatura.
Mas passamos por isso e vemos acontecerem
muitas coisas. O que mais me agradou no filme foi o Elenco: Papai com o Geoffrey
Rush (me delicio a ver seus filmes em inglês, sua dicção é envolvente, linda) e
Mamãe com a Emily Watson (Já viu “Dragão vermelho”? Veja, ela dá um show. Fora
que amo esse filme que tem outras feras inigualáveis.). A menina é lina, mas
nada de magricela como a Liesel, pois deve ter um problema sério de colocar
atores normais – isso é feito em “The Orange is the new Black”, mas só para
maiores - para ser o personagem
principal, tanto que o fizeram com os outros atores e no filme “A culpa é das
estrelas”. Ter câncer terminal e manter aquela forma? Tão idealizado quanto
irreal.
Outras adaptações que foram
inteligentes no filme são os acontecimentos que vêm no livro através de uma
narrativa psicológica (narrativa no ritmo da memória, diferente da cronológica
que acontece com o decorrer do tempo, acontecimento após acontecimento, sem ir
e voltar no tempo). Por exemplo, quando Rudy faz a vez de Jesse Owens no livro,
a Liesel não havia chegado à Molching, mas no filme colocaram a situação como
cronológica. O filme é cronológico, acho que só para alguns momentos há uma memória,
mas não lembro-me bem.
De fato chorei muito no filme,
ainda mais pelo fim de Papai, amo este ator, não o matem mais! Que seja no
filme não se pode aprofundar muito nas personagens que ali estão, ao contrário
do livro. Além de as situações ficarem inusitadas, a Liesel não conta histórias
da cabeça dela, ela simplesmente lê seus livros, ela também não é roubadora de
livros, a mulher do prefeito sabia dos roubos, se torna a roubadora de livros
devido ao fato de ela ser uma ladra devido as circunstancias de sua vida e da
dos demais adolescentes daquela região em meio a uma guerra. Ela se torna
roubadora em seu próprio livro, perdido ali na explosão em que há a fatalidade
de faze-la a única sobrevivente de sua rua Himmel.
No livro chorei quando ela foi
levada para o funeral, omitido no filme. Não lembro no filme como acaba, mas ela
fica com a mulher do prefeito e ele, convive com o pai de Rudy e realmente
reencontra com Max, ao findar a guerra.
Essas são minhas premissas sobre
a comparação, agora falando da genialidade do livro e seu autor, não sei se há
muitas narrativas assim, mas é muito bem encadeada e me trouxe surpresas. A
literatura tem se permitido cada vez mais a subverter regras editoriais e de
estilo. O livro é muito bonito editorialmente falando, estruturalmente falando
em relação a narrativa e ainda mais em seu conjunto. Personagens fortes,
história marcante, verídica ou não, facílima de ser aceita pelo leitor.
Para começar falemos da narração
e estrutura de capítulos e editorial, se posso dizer assim: a morte narra a
história por motivos que você descobrirá no final. Ela é como uma velha muito
lúcida e culta contando algo para você, mas sem repetir muito, ela se intromete
diversas vezes e uma maneira de se intrometer é o zigue zague que ela faz no
tempo para contar cada coisa, isso nos aproxima de uma narrativa oral e ainda
faz com que nos aproximemos dos personagens. Para ser exata, a morte conta pra nós o final antes de tudo, o que
demonstra que o final não é o mais importante e ainda faz com que o leitor se
apegue a história, pois apesar de dizer o que acontecerá, não diz tudo.
Ainda dentro da narrativa que
envolve livros, acima de tudo envolve a aprendizagem da leitura e da escrita de
Liesel, e a morte acaba por colocar alguns verbetes e lembretes no meio dos
textos e dos capítulos. Isso foi genial para mim, não sei se há muito disso
hoje em dia, pois costumo ler mais literatura clássica ou neoclássica, mas de
fato, inclui além disso os desenhos de Hans e de Max, os textos de Max entram
com uma caligrafia de tinta de parede, fazendo a vez de aproximar-nos do lugar
onde se desenrola, assim como a luta de boxe.
Isso pode ser genial, mas o
livro vai além da narrativa, é um hibrido de narrativa poética em vários momentos,
mas apenas com elementos de metáforas displicentes que mostram como o autor é
delicado em seu escrever e na sua visão de sua história. Começa a nos dar a
dica, a nos impor essa maneira de lidar com as comparações quando a morte
começa a falar, antes de tudo, sobre as cores. Há diversas maneiras de qualificar
as coisas, algumas estranhas demais outras delicadas à beira da emotividade,
mas principalmente que arranham-nos para entendermos aquelas passagens, para
termos em nossa pele ideal a sensação da própria morte em relação ao narrado e
descrito.
Simplesmente lindo. Eu não
esperava tanto, confesso, e me agradei por demais, mesmo com as falhas do filme.
O livro tinha 2 palavras que não conhecia, e não consultei no dicionário. Amei
isso. Poucos são os livros que o fazem hoje em dia, e não falo das mantidas em
alemão. Aliás, a tradução é muito delicada e inteligente! Parabéns à Intrínseca.
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