Terminei de ler o livro hoje e tenho
muitas observações a fazer e hão muitas linhas de pesquisas que seriam
interessantes de seguir, até mesmo para mostrar a visão do autor para a família
de seu tempo, onde as mães são superprotetoras e não dizem não e os pais são infantis e se auto flagelam culpando-se por
coisas que estão além de seu controle.
Os Darling são pais muito imaturos e
amorosos, não posso negar, mas as sua caracterização durante toda a obra
demonstra pais sem qualquer controle emocional além daquele que as crianças
conseguem fazer, trazendo suas imagens para o mesmo patamar de uma criança
qualquer do livro. Claro que tudo isso vem da visão de um narrador quase dionisíaco,
se não o próprio Pã, segundo algumas releituras deste ser mitológico ou mesmo
adaptações desta personagem.
De fato não há como presumir a idade
do narrador, que deixa claro estar falando com crianças, e não como criança,
mas não há como saber sua idade, pelo menos eu não tenho como.
O que me deixou mais horrorizada (é,
esta é a palavra) foi a diferença do que eu sabia sobre o Peter e o que ele
realmente é no original (para mim será agora o do original, revelando faces que
eu não entendia antes no Peter da Disney). O que me horroriza talvez seja o
fato de eu ser muito encantada com o Peter, nunca quis ser sua Wendy, eu queria
ser o Peter (crianças não ligam para sexo, pena que cada vez mais a idade da
criança se restrinja aos 5 anos em nossa sociedade). Eu sonhava que era o próprio
Peter, eu voava e voava... era maravilhoso, lembro dos sonhos até hoje, de tão
encantadores e satisfatórios que eram, apesar de involuntários.
Que seja, no livro encontro um Peter
muito mais novo e com seus dentes de leite. Um Peter psicótico e sociopata,
além de bipolar. A Terra do nuca é terrível, com suas ameaças muito reais e
sempre em relação à vida. A vida dos órfãos não é nada divertida quando Peter
está perto, e se ele não está, divertir-se é possível se você estivesse muito
atento à possibilidade de ele estar perto, pois sua imagem gera sempre medo nos
garotos perdidos.
Ele é como um ditador, como um
sequestrador. Ele lembrou-me o Hitler e a psicopatas de vários filmes. Claro
que em um ambiente limitado e com desejos e poderes igualmente limitados.
A maneira de o narrador descrever os
piratas como Smee, por exemplo, assusta! Parece alguém que é de alta educação
falando da dualidade das características doces de um assassino cruel. Talvez
seja um dos pontos que me deixou mais certe de que se meu filho (se vier) for
ler esta obra, será quando for muito pequeno ainda ou já adulto pois só a inocência
e a maturidade para mostrar a realidade do que está sendo dito e não deixar
passar pela cabeça que o certo é ser um assassino bem educado. Um Lecter.
Amo-o, mas como personagem e na sua condição de perseguido, preso e aliado da
polícia em jogos psicológicos. NÃO A DE ASSASSINO, como parece que o narrador
adira Smee e os outros piratas.
E aqui posso falar que o narrador
trabalha com a dualidade estreita entre as regras de convivência e educação e o
limite da violência e homicídios. A sininho simplesmente engana os garotos para
matarem Wendy por ciúmes, o capitão simplesmente mata o pirada na caçada ao
Peter por insolência, visto que ele é muito mal. Muito mal? Ele é um assassino,
assassinos não são educados, mas Gancho é. Smee é, e além de tudo sua imagem
gera simpatia, ele mata sorrindo e assim vai...
A contagem de Sabido na carnificina
realizada pelos jovens é como um filme de terror, e não há piedade nenhuma da
parte das crianças. Gancho foi condescendente em não matar o Peter, que já não
se importou nem um pouco de ser mal educado ao lhe chutar para a boca do
crocodilo, que representa o fim da vida.
Li algumas resenhas e ser um demônio,
um deus mitológico ou qualquer outra coisa não faz Peter mais viável. Claro que
podemos fazer as analogias dos estereótipos de yung e reconhecer diversos deles
que representam os extremos dentro do medo de envelhecer e o que poderia
acontecer se não envelhecêssemos.
Estereótipos familiares,
esterereótipos como os indígenas, que fazem parte do ideário americano de forma
ímpar, de piratas que representam a luta e a rebeldia, e de crianças órfãs, que
não têm que dar nenhuma satisfação. Tudo isso está ligado à como as crianças
veem a realidade, elas brincam para internalizar as regras sociais e nascem
violentas e brancas como uma folha de papel, prontas para serem nelas impressas
conquistas sociais que a farão um homem de caráter, um psicopata, um guerreiro,
etc. A maldade é ponto de vista, é cultural, o ato da maldade (de fazer o que não
é bom aos olhos daquele grupo em que se insere) só pode ser interrompido quando
se entende o que ele representa ali e quais são os seus resultados para o
agente e a vítima.
Pensar assim faz com que tudo pareça
mais normal dentro desta história onde os modelos sociais são todos deturpados
e maus, porém não acho que e distancie do país das maravilhas e das crônicas de
narnia para o fato de uma criança ler. Os filmes da Disney deixaram tudo
bonitinho (ou quase tudo, até hoje não supero a lagarta fumante e seu “Who are
you?”), já o do narnia (não li ainda, mas está na fila) é terrível, assustador,
e se o livro for nessa linha, deve ser muito pior.
Será que se a Disney não tivesse
adaptado, a minha geração seria diferente? Será que se a Disney tivesse
escolhido outras formas que não os musicais, teria enredo para garantir o tempo
do filme, com tantos cortes e desvios? Será que eu gostaria tanto assim do
Peter Pan? Você já viu o “Labirinto do Fauno”? É...
Cada vez mais eu fico chocada com a literatura
considerada infantil... “O pequeno príncipe” não é infantil, gente, vamos rever
essas coisas, nossa cultura mudou, cuidado com os clássicos que dá para seu
filho ler... pois se acha que “A lenda do cavaleiro sem cabeça” era um livro
forte para ler para uma quinta série, não está muito por dentro desta linha
literária, posso dar um spoiler a mais aqui: no livro do cavaleiro ninguém
morre!!!!
Leia antes de tudo. Antes do filme,
antes de gostar, antes de crianças lerem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário